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João Marcos Adede y Castro

Guarda doméstica de animal silvestre e a prevalência do bem-estar animal


Não se discute que os animais silvestres devem ser mantidos em seu habitat, mas é impossível desconhecer a realidade ambiental, trabalhando apenas com conceitos teóricos que, em inúmeras ocasiões, não atendem aos efetivos interesses ambientais.

Basta pensar no fato de que, em algum momento da vida do animal homem, ou até mesmo antes da sua existência na face da terra, todos os outros animais, ditos não racionais, eram silvestres, ou seja, viviam em absoluta liberdade no meio ambiente.

Mas, com o passar dos séculos, em razão da necessidade de sobrevivência, passou o homem a utilizar os animais em trabalhos e até mesmo para alimentação, o que ocorre até os dias de hoje.

Outros animais foram incorporados à vida doméstica, como cães, gatos e alguns pássaros, no mais das vezes com total liberdade de evadir-se, o que não fazem em vista da dependência criada em razão das facilidades de alimentação, abrigo, cuidados de saúde, etc.

A Constituição Federal, em seu artigo 225, inciso VII, diz que, para efeito de garantir a eficiência do direito de todos ao meio ambiente saudável, deve o Poder Público “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.

Ou seja, o fato é que quando o animal silvestre se encontra sob cuidados de humanos há muito tempo, não havendo um só episódio de maus tratos ou crueldade, está ela a cumprir as funções de proteção da espécie.

A Lei Estadual do RS número 11.915/2003, que Institui o Código de Proteção dos Animais, diz, artigo 2º, que é vedado:

I - ofender ou agredir fisicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo de experiência capaz de causar sofrimento ou dano, bem como as que criem condições inaceitáveis de existência; II - manter animais em local completamente desprovido de asseio ou que lhes impeçam a movimentação, o descanso ou os privem de ar e luminosidade;

Ora, se o animal não está sendo ofendido ou agredido fisicamente, não está sendo submetido a experiência que lhe cause sofrimento e não está em local completamente desprovido de asseio ou que lhe impeça a movimentação, não há violação da lei.

Como já referido em decisões jurisprudenciais

A devolução da ave ao seu habitat natural não seria razoável, uma vez que a mesma está protegida e sob cuidados adequados e necessários à garantia e manutenção de sua saúde e bem-estar, sendo que, devido ao longo período de tempo em que permanece sob a guarda do autor, dificilmente se habituaria em outro local fora do cativeiro. Por essa razão, dano maior ao animal seria causado na hipótese de sua devolução à vida selvagem, o que se contrapõe ao objetivo legal, de proteção ao meio ambiente, incluída a fauna (CF, art. 225 , § 1º , VII ).

(TRF-4 -AC: 50039786420144047014 PR 5003978-64.2014.404.7014, Relator: SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, Data de Julgamento: 16/02/2016, QUARTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 19/02/2016)

A jurisprudência já colacionada refere a Portaria nº 117-N/97, do Ibama, como norma regulamentadora da posse de animais silvestres, o que implica dizer que, preenchidas as condições de cuidados necessários, respeito ao bem estar animal, atendimento de necessidades de alimentação, medicamentos, espaço físico, etc., poderá o particular manter animal silvestre consigo.

Observe-se que não se trata de incentivar a apreensão de animais silvestres, mas apenas de regularizar uma situação que geralmente se prolonga no tempo, em que a ameaça dos órgãos ambientais de punição e retomada do animal para reintroduzi-la ao meio ambiente causa-lhe mais danos do que vantagens.

Também não se trata de defender o desejo do particular em manter o animal junto consigo, mas do interesse do bem-estar do animal, que está adaptado ao ambiente doméstico.

Quer dizer, mesmo que o animal originalmente não seja doméstico, não resta dúvida que está domesticado pela atenção, carinho e proteção pela longa permanência em cativeiro, sendo absolutamente prejudicial a sua retirada do ambiente ao qual está adaptado.

 

João Marcos Adede y Castro é advogado (OAB/RS 85.239) e diretor do escritório Adede y Castro Advogados em Santa Maria, RS.


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